“Ele vai continuando a fazer a sua exploração à casa cujas chaves lhe deste, o Leitor. Há uma quantidade de coisas que acumulas em teu redor: leques, postais, frasquinhos, colares pendurados na parede. Mas cada objecto visto de perto revela-se especial, de certo modo inesperado. A tua relação com os objectos é confidencial e selectiva: só as coisas que sentes como tuas se tornam tuas: é uma relação com a corporalidade das coisas, e não com uma ideia intelectual ou afectiva que substitua o acto de vê-las e tocá-las. E uma vez assimilados pela tua pessoa, marcados pela tua posse, os objectos deixam de ter o ar de estar ali por acaso, assumem um significado como partes de um discurso, como uma memória feita de sinais e distintivos. És possessiva? Talvez não haja ainda elementos suficientes para o dizer: por agora pode-se dizer que és possessiva em relação a ti mesma, que te agarras aos sinais em que identificas qualquer coisa de ti, temendo perder-te com eles”.
Italo Calvino, Se numa noite de Inverno um viajante

Ainda as naturezas mortas. A presença, o confronto entre as coisas, o seu peso, o seu poder evocativo. Um jogo acerca de aparências, entre o que parecem ser e o que nos lembram. As imagens surgem de várias formas. Podem aparecer casualmente em frases, em livros, num jornal, noutra imagem. Podem estar na cabeça há muito tempo. São muitas vezes resposta a outras pinturas, ou apenas suas descendentes. Podem estar à porta de casa, no tapete: são os frutos da caça nocturna dos gatos. Aparecem também ao caminhar, ou enquanto se move a terra no jardim (uma arqueologia acidental, do acaso).

Mais que procurar, o trabalho é principalmente estar atento, reconhecer, encontrar.

João Francisco nasceu em Torres Vedras em 1984. Vive e trabalha em Lisboa e Torres Vedras. Licenciado em Artes Plásticas-Pintura pela Faculdade de Belas-Artes de Lisboa.

Em 2007e em 2008 participa no workshop de desenho de autor, no Ar.Co, em Lisboa.