L'homme est à la recherche d'un nouveau langage
auquel la grammaire d'aucune langue n'aura rien à dire.
Apollinaire

Rui Sanches é daqueles artistas que dispensam apresentação. Umberto Eco disse uma vez que, quando alguém é referido só pelo nome, tem uma obra sólida o bastante para que este nome seja reconhecido por todos. A trajetória do artista Rui Sanches é, indiscutivelmente, uma das mais sólidas e coerentes da arte contemporânea europeia. Com um longo currículo, decidiu enfrentar de maneira reflexiva o seu trabalho e produziu uma obra, sua tese de doutoramento, que será certamente, de referência a quem pretenda conhecer não só este artista, mas o percurso das artes nos últimos 40 anos. A exposição que nos apresenta é o resultado de uma síntese da sua investigação como autor/criador, aquele que cria e que reflete sobre a sua própria criação.

O artista criou, ao longo da sua carreira, uma morfologia inusitada que o identifica, independentemente dos materiais que utiliza. Há, no entanto, uma preferência que recai sobre a madeira, através da utilização de contraplacados sobrepostos, criando uma arquitetura onde a estrutura aparente denuncia a falsa fragilidade da peça. Podemos ver a sua obra como um desenho no espaço. Um desenho que se espalha e que ganha volume, relacionando-se com o entorno que se converte numa folha, onde Rui Sanches, com precisão, delineia formas. A madeira, que possui uma maleabilidade muito própria, torna-se fluida pelo traçado da justaposição, de um encaixe invisível, e projeta-se para fora de uma estrutura que, sendo maciça e podendo ser rígida, mantém a leveza do traço do lápis no papel.

Talvez, mais do que um desenho no espaço, possamos pensar nos photogenics drawings de Talbot (circa 1840), nas quais as formas se imprimiam no papel sem a mediação de um aparelho fotográfico. Era a luz, e a química colocada no suporte, que tornava o objeto visível – visível em sua densidade, como se emergisse da sombra. A obra de Rui Sanches tem um carácter dual: joga com a densidade e com a transparência, e faz ver, nas suas formas, o impalpável, as brechas da madeira, o entrevisto, o projeto que emerge na obra pronta. Como em Talbot, o objeto vence a sombra e apresenta-se visível: e, na sua presença diz aquilo que o artista sugere. Há muito que as formas deixaram de ser silenciosas, há muito que aprendemos o significado do silêncio e dos não-ditos. E a obra de Rui Sanches não precisa de dizer nada. Mas o artista decidiu dizer por ela e dizer, através dela, a própria história da arte que também o compõe.