Começar uma semana sempre traz um ar de tristeza pelo final de semana que acabou. Ah, o final de semana! Final de semana é tipo férias, mas em uma dose bem pequena. Nestes curtos dias de folga a maioria curte o ócio, o churrasco com os amigos, a festa até o dia amanhecer e tudo mais que der tempo de fazer. Mas, eis que surge no horizonte a segunda feira, o começo da semana, ou poderíamos dizer também, o recomeço.

A fadiga já começa no domingo a noite, ás vezes é a ressaca nos fazendo lembrar como será difícil acordar no outro dia cedo e encarar toda a vida lá fora, de novo e, o pior, sóbrio. Outras vezes, é aquele programa de TV meio depressivo que nos faz lembrar que acabou, já era, boa sorte, a segunda vai pintar de novo e com ela todas as obrigações e exigências que a vida nos impõe.

O ser humano tem a capacidade de ser muitos em um só e, definitivamente, de segunda a sexta somos um ser bem diferente daquele que surge na noite da sexta feira e dura até domingo de tarde. Sim, domingo à tarde porque, como dito anteriormente, domingo à noite já entra outro em cena, alguém bem mais calado e tímido, aguardando com medo a segunda feira.

Neste contexto, relacione-se a chegada da segunda feira com uma criança que dança na chuva pela primeira vez.

Primeiro o céu fica escuro, parece que vai cair uma chuva daquelas de alagar a cidade, dá medo em todo mundo, a mãe fecha a casa inteira e a criança fica ali, meio hipnotizada por aquele céu cinza, olhando da janela e imaginando: “O que vem por aí? Será que é o tal do dilúvio, de novo?”

Depois vem aquela ventania típica, parece até que ela quer dizer: “A chuva feira vem aí”, quer dizer, “a chuva vem aí”! A criança, do lado de dentro da casa, se põe assustada com o balanço das árvores. Parece que as árvores querem fugir dessa chuva que está para cair e querem se esconder dentro de casa juntinho da criança.

Alguns minutos se passam e os primeiros pingos escorrem bem lentamente pelo vidro da janela. Aquele pingo é como os primeiros raios da segunda feira. A gente acorda meio inseguro, pensando que tem muita coisa pela frente naquele dia, mas ainda não dá para saber como vai ser. Só conseguimos mesmo é sentir a dor de ter que levantar cedo depois de um final de semana.

Eis que a chuva cai, molha a terra, lava a janela, as folhas das árvores e quem mais estiver do lado de fora. E a janela que antes permitia à criança a admirar o lado externo agora embaça. A imagem não é mais nítida, tudo que a criança consegue é ouvir o som da chuva. E que som! Parece que é a voz da natureza dizendo: “Venha banhar-se”.

Disfarçadamente, a criança olha para um lado, olha para o outro, percebe que a mãe não está por perto e sai da casa. Fica ali na calçada meio desconfiada, ainda protegida pelo teto, sentindo a brisa fresca da chuva, ouvindo bem mais forte o som da chuva e admira a água que escorre na rua.

Mas, como diz o ditado: “Quem está na chuva é para se molhar”, e não poderia ser diferente com a criança curiosa. O carro passa e joga sobre ela aquele jato d’água suja, gelado e assustador.

A primeira vontade é de chorar! Afinal, a mamãe tinha colocado uma roupinha tão limpa e quentinha e veio esse carro louco e a molhou.

É assim também conosco quando saímos de casa nas primeiras horas da segunda, a vontade é de chorar e se perguntar: “Cadê o meu final de semana, meu café da manhã demorado com a família, meu passeio no parque, cadê a vida que estava aqui?”

Ao se descobrir molhada e encrencada com a mãe que o havia advertido a não sair de casa, a criança resolve ir além. Vai ver qual é a dessa chuva!

Sai debaixo da proteção do teto e vai banhar-se. Timidamente sente aqueles pingos que parecem arder na pele macia, mas aí o pé encharca, a roupa cola no corpo de tão molhada e nada mais a incomoda. O som da chuva parece música e a criança percebe que dá para dançar nela.

A criança descobre naquela chuva que ao se formar parecia mais com uma perigosa tempestade que a vida acontece a todo o momento, seja chuva ou sol, o que não dá é viver a vida do lado de dentro, amedrontado, vendo o mundo pela janela embaçada.

O sol é delicioso, dá para ir à praia, ao parque, dá para fazer churrasco na varanda, brincar na rua, enfim, são muitas opções.

No entanto, quem está vivo não consegue ouvir o som da chuva e ignorá-la. A vida pulsa mais forte quando a chuva vem. A terra se alegra, as árvores florescem, as sementes brotam, o homem dança na chuva. É a vida que lava o suor que o sol causou na pele.

Assim também ocorre nas segundas feiras que a vida nos traz. O final de semana é feito o sol, são dias de praia, de descanso e de festa. Mas, a segunda feira também é dia de vida.

Por isso, o que precisamos aprender com a criança é que mesmo que o susto da segunda feira tente embaçar a nossa vidraça, ela nos chama: “Vem viver”! Cabe a nós escolher se vamos ficar na calçada da casa levando banho de água suja dos carros que passam ou se vamos nos banhar na chuva, sentir na pele o pingo, até que todo corpo esteja molhado de tal maneira que a única coisa que dá para fazer é dançar.

Viva a chuva, viva a segunda feira e todo o restante da semana. E quando chegar o final de semana, viva também. Estamos aqui para isso.