Ainda no início do século XX, as indagações acerca da clínica infantil foram fontes de muitas inquietações teóricas, e é com Freud mesmo que tem início a psicanálise com crianças. Com o famoso caso do pequeno Hans, o pai da psicanálise detalha um caso de fobia, em uma situação muito específica, já que Freud viu a criança uma única vez e o tratamento esteve a cargo do pai. A leitura do legado freudiano acerca da técnica e da estruturação deste psiquismo infantil ficou a cargo daqueles que posteriormente se ocuparam do sofrimento psíquico na infância.

Sabemos que a psicanálise diz respeito ao sujeito, não importa se criança ou adulto, no entanto, devemos considerar que esta clínica tem suas especificidades em relação à clínica com adultos.

Com o estudo e a elaboração de técnicas para uma psicanálise com crianças, o brincar dentro do setting terapêutico passou a ser aplicada e entendida como meio através do qual a criança pode associar livremente, já que estas são, em sua maioria, incapazes de realizar associações verbais. Podemos entender que as livres associações se dão por meio do brinquedo durante as sessões, pois é através da brincadeira que a criança expressa suas fantasias inconscientes.

Para o médico pediatra e psicanalista Donald Woods Winnicott, o brincar é essencial e manifesta a criatividade. O líder da Sociedade Britânica de Psicanálise Independente, e Presidente da Sociedade Britânica de Psicanálise postulava que:

é no brincar que o indivíduo, criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e é somente criativo que o indivíduo descobre o eu (self).

Assim, as brincadeiras, dentro deste setting terapêutico, podem ser consideradas atividades repletas de sentidos, nas quais o indivíduo elabora situações traumáticas, aliadas na construção psíquica do sujeito e uma ferramenta imprescindível nessa prática clínica, que não somente é possível, como é extremamente profícua.

Mas quando chega ao fim a análise de uma criança?

Uma dúvida muito comum que chega a mim através de pacientes, pais e colegas diz respeito ao fim da análise de crianças. Embora esse questionamento pareça muito simples, a resposta pode ser um pouco mais complexa.

Usando a analogia do jogo de xadrez, Freud propõe, em seu trabalho Sobre o início do tratamento (1913/1980b), que apenas a abertura e o final do jogo podem ser apresentados de forma sistemática e completa, enquanto o desenvolvimento do jogo é marcado pela incerteza. Da mesma forma, uma explicação sobre o processo psicanalítico para os iniciantes segue o mesmo padrão. Jacques Lacan (1968), ao revisar essa ideia, destaca que o início e o fim do "jogo" psicanalítico correspondem à instalação da transferência e aos destinos que ela assume, enquanto é muito mais difícil definir como esse jogo se encerra. Foi somente por volta dos anos de 1930 que Freud, partindo da sua experiência clínica com adultos, se dedicou ao tema do final do tratamento psicanalítico, tendo publicado Análise Terminável e Interminável, como resposta à publicação de Sandor Ferenczi O problema do fim da análise, de 1928.

Mas para pensarmos em questões inerentes à análise de crianças, para além de seu término, devemos trazer à tona uma problemática que Freud nos apresenta em 1909:

a terapia dos estados nervosos da criança sempre se deparará com uma grande dificuldade: a neurose dos pais, que formará um muro diante da neurose da criança.

Isto é, no decorrer do processo de análise, a criança busca estabelecer sua identidade e ser reconhecida como um sujeito, contando com o apoio do analista. No entanto, ocasionalmente, a postura dos pais em relação ao desejo e à castração apresentam-se como um obstáculo inevitável.

Claramente, o que se põe em jogo aqui é a especificidade da criança, enquanto sujeito ainda dependente das posições dos pais. Lacan, em seus comentários sobre o caso do pequeno Hans, menciona esse problema. Certamente, a fobia foi curada, então o objetivo terapêutico foi alcançado. Mas, fica claro o modo com o qual ao final da análise o pequeno Hans se organiza de forma muito particular. Lacan enfatiza que a criança, apesar de todas as suas tentativas, de todos os seus sintomas fóbicos, não encontrou em seu pai uma via de elaboração da prova do complexo de castração. Em O seminário, livro 4: a relação de objeto, o psicanalista afirma:

Pode-se dizer que o pequeno Hans não passou pelo complexo de castração, mas por outro caminho. E esse outro caminho [...] o levou a se transformar em outro pequeno Hans. [...] O pai que não teve sucesso em seu próprio cargo, é ele que deveria ter sido submetido à análise.

Avançando um pouco na história do tratamento psicanalítico com crianças, temos Anna Freud e Melanie Klein ressaltando a importância do acolhimento e do manejo dos conflitos, angústias, expectativas e culpabilidades dos pais. Klein, uma das maiores pensadoras do campo da psicanálise com criança indica que, ao término do tratamento, deve-se esperar, além do resgate da possibilidade de brincar e elaborar situações traumáticas, que a criança possa restabelecer uma boa convivência com seu ambiente e com seus pais.

No entanto, a dúvida crucial que se coloca é: o que se pode esperar do final de uma análise de criança, considerando sua efetiva dependência do desejo materno e do ambiente familiar? Isto nos leva de volta à obra freudiana, que nos diz que o rochedo da castração, se impõe como o obstáculo derradeiro para um término satisfatório do tratamento.

Por fim, constata-se, sem surpresa alguma, que a questão do fim da análise abarca todos os questionamentos intrínsecos à análise infantil. Então devemos questionar: Qual é a visão que o analista possui da criança e qual papel ele atribui aos pais no processo?

Essa problemática ainda é pouco discutida e apenas algumas produções teóricas nos permitem ter uma ideia disso. A razão é enigmática. Talvez isso se deva ao fato de que a criança é um ser em ainda em construção, inacabado, e que nada, nem mesmo uma análise mais aprofundada, pode garantir o que ela se tornará neste devir. Aceitar isso exige a mais radical das renúncias, tanto dos pais quanto do analista, como bem esclarece Claude Boukobza em Breve curso sobre o final da análise com as crianças, (2002).