A música pop do Brasil é o sertanejo e a causa disso é o agronegócio. Já falamos um pouco sobre investimentos na indústria do entretenimento, e quando falamos em investimento no segmento agro os valores são exorbitantes. A causa desse movimento cultural e desse “abraço” à cultura sertaneja é porque os donos do país são os fazendeiros, latifundiários, produtores rurais… os donos de gado.

Muito se admira os produtores rurais que dizem até que “carregam o Brasil nas costas” expressão muito utilizada no período eleitoral, principalmente na região Sul do Brasil, quando grande parte dos apoiadores do governo de Bolsonaro eram os produtores rurais e latifundiários mas, não podemos esquecer que os donos do Brasil herdaram suas terras das capitanias hereditárias. Vale lembrar que as capitanias hereditárias foi o sistema administrativo implementado pela Coroa Portuguesa em 1534, porque os portugueses tiveram receio de perder suas terras conquistadas para outros europeus que já estavam negociando com os indígenas e buscavam se fixar ali. Para tanto, a Coroa Portuguesa imediatamente adotou medidas para povoar a colônia, evitando, possíveis ataques e invasões.

Quem recebia uma capitania, tinha o direito de escravizar os indígenas, cobrar e doar lotes de terra não cultivados (esse processo foi chamado de sesmarias), explorar a região e usufruir de todos os recursos naturais assim como animais até madeira e minérios, desde que uma parte ficasse para a coroa Portuguesa. Assim como, ficavam responsáveis por desenvolver a economia local, povoar, administrar e proteger o território, mas não recebiam nenhum tipo de ajuda ou financiamento por parte da coroa.

O dinheiro do país vem do agronegócio, as regiões colonizadas por italianos, alemães, franceses são regiões muito ricas, com muitas indústrias e realmente grande parte da economia do país gira em torno dessas regiões. O Brasil na verdade, ainda hoje é uma grande fazenda, onde as famílias com muito poder aquisitivo ainda detêm o poder, e acredite, se eles são os donos da fazenda, nós somos os trabalhadores. Porém, a maior parte do Brasil é Da Silva ou Santos, as famílias que dominam o Brasil hoje são donas da terra e da política e o sobrenome é europeu, mas vivem no interior comendo galinhada, tocando gado e ouvindo o famoso “modão” ou o sertanejo que eles mesmo pagaram para tocar, as vezes é o filho de um funcionário, a filha de um fazendeiro ou um conhecido de uma amiga que canta… poderia ser qualquer um.

Quando falamos de cultura e entretenimento, os grandes festivais de música do país são financiados pelo agro, que detém não apenas as terras e a política, mas também os eventos, rádios e mídia. Então se você pensa em dar certo na carreira musical, tenha um bom relacionamento com os donos do Brasil.

Com esse contexto, conseguimos entender melhor a música sertaneja comercial como Zezé di Camargo e Luciano, Leandro e Leonardo, Daniel, e por aí vai… Agora, vamos considerar a demanda que pode ser natural ou fake. No caso da demanda natural, ela não pode causar padronização, já a demanda fake pode sim causar padronização (que é o que acontece atualmente no segmento), por isso, a demanda natural pode até chegar nas mídias de massa, mas não permanece ali por muito tempo. O que te faz permanecer na mainstream é o dinheiro, apenas. No caso da demanda fake, com os altos valores de investimento nas mídias, rádios, televisão, e todo tipo de comunicação de massa existente, é possível sim, não apenas gerar essa demanda, mas também permanecer no topo e continuar gerando renda a partir disso.

O show de uma dupla sertaneja em evidência facilmente passa dos 250 mil reais, pode até ser um investimento de risco, mas além de ser atrativo ele gera retorno financeiro e emocional. Pois tudo que o fazendeiro quer, depois de passar a semana toda trabalhando, é aproveitar o fim de semana no camarote do artista que que ELE investiu, então mexe também com o ego e pode gerar um sentimento de merecimento, recompensa e visibilidade.

Além de todo o investimento, é inegável mencionar que a música sertaneja também ganhou popularidade pela identificação com o povo. Apesar de o sertão não ser o estilo de muitos lugares, abraçamos uma ideia coletiva de que todos pertencemos ao sertão, e essa ideia de um sertão comum é vendida de norte a sul da grande fazenda chamada Brasil. Essa música, trás um sertão comum, que nunca existiu, por exemplo, Rio Grande do Sul, não tem absolutamente nada a ver com o Mato Grosso, que não tem nada a ver com a Paraíba, que não tem nada a ver com São Paulo, mas todas as regiões (por causa dos valores investidos) são fiéis a essa ideia coletiva.

Você provavelmente já ouviu a música “No dia que eu saí de casa”, essa foi uma das canções de maior sucesso da carreira de Zezé di Camargo e Luciano, e teve um crescimento maior ainda depois do filme “Os dois filhos de Franscisco” que conta a história de vida da dupla. Mas, você sabia que o compositor dessa música é o gaúcho chamado Joel Marques, que escreveu a canção em homenagem a sua mãe. Esse é o retrato perfeito do sertão coletivo que falamos a pouco, uma composição gaúcha, interpretada por um goiano, que no filme, retrata a vida de um nordestino e também de um mineiro. Este é o retrato do Brasil, descendente de homens e mulher fortes, que trabalham, que lutam, que desbravaram terras e terras para conquistar novos horizontes, que produz a terra, que empreendem, que têm suas vidas amorosas à flor da pele, é essa a representação da música sertaneja.

Uma das pautas de maior ênfase quando falamos e tratamos da composição e letras da música sertaneja, é o amor. Por isso também que existe uma afinidade com o público que ouve as canções e é consumidor dessa indústria. Ninguém é ou está imune de amar. Verdadeiras poesias cantadas, que tocam o coração, que falam das dores que um dia todos nós passamos, de amores que podem ser que não acontecem, trata a dor sem mascarar ou tentar esconder o sofrimento, que para o sertanejo é motivo de orgulho, de bater no peito e admitir que amou mesmo e está sofrendo por amor. O mesmo orgulho dentro do segmento se dá com letras românticas, a verdade e a simplicidade dos versos, que são entendidos tanto pelas pessoas mais simples e sem muito acesso à educação, até àqueles com maiores níveis de estudo. O sertanejo fala com todos aqueles que sentem e não tem vergonha de amar e ser amado, mesmo que doa. Porém, não vamos nos deixar levar pela emoção de um discurso lindo de amor, porque só bate no coração, porque bateu nas rádios e nos top 1 das playlists, já que o investimento foi gigantesco, o resultado precisa ser no mesmo nível.

Além de letras românticas, o sertanejo canta os interesses comerciais e políticos do agro. Podemos ver que os interesses de quem canta o sertanejo são os mesmos dos empresários rurais, e na hora de fazer campanhas políticas e escolher um dos lados da moeda, não existe bem uma escolha, quando estão todos do mesmo lado. A direita. E os interesses da classe dominante, são colocados como interesses gerais como se fossem causas nobres e para favorecer todas as classes, quando sabemos que não é bem assim que a nossa banda toca. Mas esse é um assunto para outro artigo, de qualquer forma, você artista independente e sonhador, não se iluda com histórias de sucesso mirabolantes e avassaladores, fique descansado e faça sua música porque lhe apetece, já que você provavelmente não vai acontecer, enjoy the ride.