Uma das muitas coisas que a maternidade me ensinou é sobre o valor do tempo. Logo eu, historiadora de formação, acostumada a dizer aos quatro ventos que o tempo era minha maior matéria prima enquanto pesquisadora. Pois foram os meus pequenos que descortinaram, para mim, a beleza e a crueldade do tempo.

Ao mesmo passo que as noites com o bebê chorando parecem intermináveis, os meses parecem acelerar e os anos, então, é mesmo como piscar os olhos. Os filhos escancaram a relatividade do tempo: as gripes parecem eternas, os momentos brincando na piscina, efêmeros. Verões com férias passam a correr e começam a ser fugidios. Não vemos a hora do desfralde e de repente já estão eles pedindo para trancar a porta do banheiro. É um eterno “tomara que passe logo” com “não acredito que passou tão rápido”.

Pois bem, há tempos historiadores, filósofos, cientistas sociais e outros tantos intelectuais vem sinalizando o fenômeno da aceleração do tempo, próprio da Modernidade. Muitos destacam o fato de que a rapidez das transformações históricas trouxe mudanças significativas no ritmo temporal, gerando um deslocamento das tradições e valores através de uma perda de estabilidade, aumento de incertezas e um sentimento de precariedade em relação ao futuro. Especialmente nas últimas décadas, com os avanços tecnológicos e a compreensão de que a humanidade se tornou uma força geológica capaz de alterar significativamente a estrutura e o funcionamento do planeta - incluindo mudanças climáticas, extinção de espécies, poluição do ar e da água, entre outras – a temática tornou-se ainda mais urgente. Mas reforço, na experiência pessoal, foram mesmo os pequeninos e assustados olhos do meu bebê e os braços cada vez mais compridos do meu pequeno menino que deram concretude ao sentimento até então, abstrato.

Isso se deu não apenas para entender como sentimos esse tempo de forma relativa, como sinalizei acima. Mas também para percebê-lo mesmo como algo que sempre falta: nunca temos tempo suficiente. Nesse sentido, sentimos na pele a percepção de que as vidas necessitam incorporar o tempo a partir da dinâmica do mercado financeiro, onde a velocidade das transações é cada vez maior, com um ritmo específico e uma lógica de ação distinta daquela presente em outros espaços. Há assim uma pressão para que as métricas do tempo do mercado se estendam para todas as esferas e instâncias da vida a partir de uma linguagem que se baseia nos princípios da eficácia e da eterna urgência. Uma “ressicronização” dos tempos sob a égide neoliberal: tudo é para ontem e nunca há tempo o bastante, inclusive na relação com nossos filhos.

A maternidade (e a paternidade, quando de fato ativa) demanda outro tempo, que não o da urgência. Demanda o olhar nos olhos, o brincar despreocupado, o observar crescer. É o tempo de montagem de Legos e das longas boas histórias. Mas, especialmente no mundo do trabalho – que é o que garante a sobrevivência para a grande maioria das pessoas – o tempo é o da eficiência, o do fazer mais em menos tempo. Esse descompasso entre o que as infâncias clamam e o que o mundo pressiona é o grande gerador de culpa que nos acompanha todo santo dia.

Esse sentido de urgência somado à ideia de um futuro próximo e nebuloso, embalado por uma série de crises ambientais, mergulha cada vez mais a contemporaneidade em um horizonte de expectativas assustador. E aí que mais uma percepção sobre o tempo me invadiu de mãos dadas com a maternidade: as crianças por vezes aumentam a esperança; outras tantas despertam o medo que nos invade por percebermos o que elas terão que enfrentar. Temos um futuro fagocitado pelo presente, que sufoca e mergulha no medo e incerteza e ter filhos é a síntese desse temor com uma esperança carregada de amor, que impulsiona mesmo no escuro.

Esses pequenos não me trouxeram respostas, mas me encheram de perguntas sobre o tempo que uma ingênua historiadora nem imaginaria antes deles. Por fim, acabo por passar os dias a pedir que o Universo me dê tempo para habitar o presente, conviver com o passado e viver o futuro, na esperança de que meus filhos se tornem homens que tenham tempo para revolucionar o mundo.