Título reflexivo, não? Acredito que estamos aqui de passagem; de maneira breve, deixaremos nossas marcas nesse lugar e seremos marcados por vivências positivas e negativas. Assim, vamos nos constituindo, nos formando, aprendendo a ser "gente", a partir das nossas escolhas, caminhos, crenças, atitudes, parcerias; enfim, o meio que nos envolve. O corpo e a mente se engrandecem, se expandem e vão buscando suas próprias convicções e experiências.

Nesse trajeto, que as linhas antes reduzidas vão atravessando espaços e mundos talvez inabitáveis, mas necessários. Necessários para entendermos o quanto somos plurais, diversos em cultura, religião, opinião, costumes.

Podemos perceber essa pluralidade até mesmo em nosso âmbito familiar. Quanta riqueza há em uma conversa, na comunhão entre parentes, na troca de vivências, ou até mais próximo, em nosso vizinho ao lado, parede com parede. Mesmo assim, não somos iguais; pensamentos, postura, crenças nos divergem.

Há um pequeno conto de Eduardo Hughes Galeano, jornalista e escritor nascido em Montevideu (Uruguai), sobre a singeleza da relação entre pai e filho, que denota um momento de cumplicidade diante do mundo que se apresenta aos olhos do pequenino. O garoto nunca tinha visto o mar e, uma vez frente à sua grandeza, pede ao pai que o ajude a ver. Pode ser que nem mesmo o pai do menino tivesse olhos para alcançar toda a imensidão do mar, ou talvez ele mesmo o tivesse visto pela primeira vez. Contudo, cumpre a sua função ao possibilitar ao filho a descoberta do mundo.

O quão cruciais são que apresentemos aos nossos filhos ciclos diferentes dos nossos, pessoas com culturas que não são nossas e lugares diferentes dos habituais. Viajar é um mergulho, um convite para o novo, um novo lugar, novas pessoas, novos costumes.

Quando desde crianças temos essas experiências, com percepções opostas às nossas, tendemos a acreditar e respeitar o entorno, o outro. Há igualmente momentos de profunda realização, talvez a maior parte deles, se todos souberem entender a arte da vida.

Gabriel Chalita, advogado e escritor brasileiro, diz que é fundamental que uma pessoa se aceite como é. Isso não significa que não possa melhorar; entretanto, deve aceitar a família em que nasceu, porque foi essa e não outra. Deve aceitar a idade que tem hoje, diferente daquela que já teve, porque o tempo é implacável. Aceitar que o envelhecimento faz parte da vida é imprescindível para a felicidade. Pessoas que não aceitam as perdas que o tempo traz, como a morte dos entes queridos, por exemplo, vivem amarguradas, e esse sentimento acaba refletindo nas suas relações com as outras pessoas.

Tudo, todos os processos vividos em nossas vidas, fazem parte de algo maior, algo que nos envolve, nos forma e nos faz ter a compreensão e o respeito ligados à busca do equilíbrio em meio à inconstância.

Recorte da carta da brevidade da vida de Sêneca, sobre a piedade, sobre a sobriedade, sobre as duas formas de pudor, aquela que não viola o corpo alheio, bem como cuida de si mesmo. Se não me quiseres conduzir por desvios, chegarei mais facilmente à meta que me dirijo, pois como diz o famoso trágico: “O discurso da verdade é simples”. Assim, não é preciso complicá-la, pois nada convém menos a um espírito que tem grandes aspirações que essa inferior astúcia.

Sêneca, nessa carta, ilustra um pouco do ser que deveríamos seguir, ou ao menos estar próximos. Despertar o corpo e olhar para memórias, para lembranças, para a vida que pulsa é acordar para o presente, se encontrando nesse lugar de respeito e de experiências abundantes na diversidade, entendendo que sem respeito pelo outro e por todos nós, não há vida.