Fernando Carmino Marques sabe como poucos levar a poesia à voz alta, gesto que requer amplo conhecimento acerca do que significa a poesia. Português, herdeiro da tradição da boa declamação, consegue dar voz aos versos, porque é capaz de compreendê-los profundamente. Além disso, sua leitura se baseia ainda em seus conhecimentos de teatro, desenvolvidos em ampla experiência no palco, assim como em estudos universitários. Dentre os vários poetas escolhidos para leitura por Fernando Carmino, está Fernando Pessoa, escritor português que o estudioso conhece muito bem.

Doutor em Letras pela Universidade de Paris IV, tem estudos publicados acerca de escritores de Portugal e do Brasil, cuja produção se localiza nos séculos XVI, XIX e XX. Realizou ainda importante trabalho de tradução e de edição de estudo inédito de Pierre Hourcade sobre a poesia de Fernando Pessoa, publicado sob o título A Mais Incerta das Certezas, Itinerário Poético de Fernando Pessoa (Tinta-da-china, Lisboa, 2016). Traduziu ainda o volume de poemas O amor é uma companhia, com o título em francês L'amour est une compagnie, livro de minha autoria, publicado, em edição bilíngue, em Paris, pela Éditions Convivium Lusophone, em 2019.

Como escritor de ficção, publicou, em 2019, o livro Sobre outra coisa ainda (13 short stories) e, no ano de 2021, o volume Neste sonho que sou de mim. Recentemente, em 2023, lançou Como se de outro ela fosse. Tem publicado micro-relatos, em português e na tradução em castelhano, no periódico Atril Press – Gente que cue(o)nta.

Docente do Instituto Politécnico da Guarda, em Portugal, atualmente é professor convidado na Universidade de Atenas. Ministra, em seu país natal, no Brasil, na Grécia, na França e em outros países, cursos em torno da poesia. Além disso, é chamado para proferir palestras, especialmente sobre o poeta Fernando Pessoa, assim como para realizar leituras de poemas em voz alta, em instituições nacionais e internacionais de ensino superior.

Como conhecedor de poesia, gentilmente, Fernando Carmino respondeu a três questões de uma pequena entrevista, disposta a seguir, em que discorre sobre a maneira como entende a poesia, de forma geral, tecendo também reflexões acerca da leitura de poesia em voz alta e sobre os versos em língua portuguesa produzidos no Brasil.

O que é a poesia para você?

A noção de poesia deve ser vista numa perspetiva muita alargada. Direi que não existe uma única maneira de definir esse género literário que há muito deixou de obedecer a qualquer critério formal ou de conteúdo. Para mim existe uma poesia de conteúdo (de ideias se quisermos), uma poesia da língua e uma poesia da imagem.

O que considera uma boa leitura em voz alta?

Uma boa leitura em voz alta é aquela que respeita o texto na sua integralidade, o seu ritmo, a sua música interna, o seu silêncio. Sem ênfases desnecessários, sem teatralidade. Quando, pelo poder da palavra, um poema é suficientemente sugestivo, o leitor retira-se para dar lugar ao texto, deixando que o poema faça o seu caminho na mente e na alma de quem o ouve.

O que acha da poesia brasileira?

A nacionalidade de um poeta é a língua em que se exprime. Para mim a ideia de uma poesia própria de um país é ainda um resíduo do romantismo tardio e que infelizmente ainda persiste em muita gente. Era preciso verificar e confirmar se todos os poetas de determinado país seguem, por vontade própria, as mesmas escolhas temáticas ou formais. Mas o que constato é que cada poeta nascido no Brasil podia ter nascido em qualquer outro país, é ele próprio com a sua originalidade e idiossincrasia.