Perceber o que está diante de mim, o que está comigo, saber o que é e constatar permite consistência, cria sistemas de referência, estabelece direções e guias. Essas orientações tempo-espaciais sustentam o outro, o que está diante de mim. Inicia-se, assim, o processo de confiança, a crença de que não se está só, ou seja, que existem outros. Essas estruturações determinam camadas ou níveis e posições, e então, o familiar e o inóspito são estruturados.

Feitos os sistemas de orientação surgem crenças, certezas, dúvidas e medos. Alguns caminhos são percorridos e outros são evitados. Trajetórias relacionais são estabelecidas, assim como são também estabelecidas confiança e desconfiança.

Quando se confia, se acredita. Confiar é encontrar, é descobrir o outro, a evidência, e por meio dos relacionamentos constatar, identificar níveis de certeza e de crença. Essas descobertas, essas vivências situam o ser-no-mundo e permitem que ele exerça suas necessidades e possibilidades relacionais.

A crença é uma extrapolação dos dados que foram remetidos a universos mais abrangentes, podendo gerar confiança. Quando crenças são impostas, seja pelas religiões ou pelas ideologias, elas são transformadas em rígidas e mortíferas regras que impedem transcendência e descoberta. Não há como acreditar no que é imposto. Na imposição não há lugar para crença, pois tanto Deus quanto ícones sobrevivem encarcerados nas aparências conseguidas. Ideologias tampouco sobrevivem quando viram regras do que é melhor e do que é único.

Sem constatação não há confiança e não há crença. Os fatos vivenciados são como contas soltas de um colar, pontualizados. Uma continuidade quebrada, restando, por conseguinte, amealhar fragmentos, verificando semelhanças ou dessemelhanças. Nesse contexto, segue-se com padrões e regras sobre os quais superpor as figuras coloridas de desejos e esperança, mas que não se encaixam e não podem ser verificadas. Essas vivências fragmentadas são alienantes e transformam o ser humano em executor de regras, leis e padrões, buscando sempre um momento de luz, de encontro e descoberta. É o vazio, é o medo que norteia os atos, não há confiança, não há crença, sequer personalização, desde que identidades há muito foram perdidas. Cada vez mais o semelhante é percebido e o diferente desconsiderado ou percebido enquanto objeto e impedimento que atrapalha. Preconceitos sustentam e mantêm desconfianças, passando a estruturar as certezas do que é bom, do que é ruim, sinalizando todos os caminhos das interações.

Viver é confiar. A crença e a confiança em si mesmo - a partir de descobertas e constatações - estruturam autonomia. Não havendo confiança, o que existe é submissão, estruturando seres despersonalizados, dirigidos para sobrevivência, agarrados em propósitos, buscando manter seu bem-estar no mundo, aguardando dias melhores ou sociedades mais condizentes com seus interesses.