Aporias são limbos. Tudo é escorregadio, nublado, nada se explica por si, consequentemente nada continua, nada abre perspectivas. Nos dicionários, aporia “é a dificuldade ou dúvida racional decorrente da impossibilidade objetiva de obter respostas e conclusões para uma determinada indagação filosófica”.

Aporia é a falta de saída, o esbarro que cria perplexidade: o que era passagem ou saída vira obstáculo. As certezas caem por terra, faltam palavras para expressar o que se vê, o que se ouve, o que se está sentindo. Essa sensação de estar fora do mundo, de abismo deglutidor existe quando os laços que sustentam participação e acertos são cortados. Ver fantasmas, saber que o grande guru era um charlatão, descobrir que por meio do internamento incentivado para tratamento tem uma rede montada para captar órgãos e vendê-los, é desnorteador, é a não conformidade com o que é legal, com o que é apregoado pelos sistemas.

A vida orientada pelo lucro e restrita à captação de recursos, captação de matéria e dinheiro, transforma tudo em ganhos, privilegiando evitar perdas. Nesses casos, leis são ineficazes ou apenas ocultam o que se quer esconder. Ser iludido, ser enganado é frequente, mas isso faz parte de outro plano no qual o sentido e as pessoas são transformadas em matéria-prima, em fatores para outros lucros. É aterrador, tudo fica solto, sem fé, sem lei, sem rei.

Uma das principais aporias de nosso sistema foi a transformação de seres humanos em escravos, em mercadoria para implementar agricultura, industria e riqueza. A utilização de redes caçadoras de mulheres para prostituição, de crianças que suprem córneas e diversos órgãos, revelam o lado miserável e desumano dos homens, acobertado por sistemas estruturados no lucro e na ganância. Não fosse assim não teríamos as recentes tragédias ecológicas, ambientais e humanas. A falta de manutenção das máquinas que geram economia empresarial ceifa vidas. Elevadores falham, aviões caem, construções desabam, lamas residuais matam, tudo isso é afirmação dos interesses econômicos que são exercidos para baratear custo e incrementar lucro, mas que matam e deixam perplexos e sem saída, comunidades, sociedades e indivíduos.

Nas frequentes perguntas “para que tudo isso? para que viver?” e “como aconteceu isso comigo?” encontramos a perplexidade, a falta de perspectivas, o não discernimento. Somente por meio de constante questionamento individualmente exercido é que se consegue neutralizar perplexidade, mas, nos diversos contextos sociais também é necessário falar de transformação e engano. Por isso é fundamental denunciar, ter leis que possibilitem punição, que impeçam perdas e prejuízos ambientais e humanos. Frequentemente donos de industrias pensam que é mais vantajoso prejudicar o meio ambiente ou ter perdas humanas para obter maior lucro e calculam que multas e gastos com indenizações por gerar desastres ambientais e humanos saem mais baratos do que investir em manutenção, segurança e prevenção. Da mesma forma, na área da saúde, industriais consideram que quanto mais doenças maior a venda de remédios, ou ainda, que quanto mais mortes, mais fabricação de enterros e de incinerações, ou de órgãos para comercializar.

O bem estar não pode ser comprometido em favor de fáceis soluções societárias e maximização de lucros. Não é preciso mudança revolucionária para evitar que isso aconteça, basta apenas que se considere o humano como humano e não como matéria prima para ampliação de lucros. As crianças no Laos, Vietnam e Myanmar, por exemplo, que são utilizadas como mão de obra na confecção barata de produtos com lucro maximizado, são comprometidas e massacradas sem que isso signifique problema para as empresas, pois o foco está apenas no lucro.

Todo dia surgem aporias, perplexidades, situações sem saídas. Não adianta dar a volta, fechar os olhos, descobrir que o melhor é ficar parado. Esse posicionamento destrói todo o caminho, toda perspectiva de ser no mundo. É preciso não virar mercadoria, não ser escravo do poder, da mentira ou de aparências alienadoras.