Miomas são “personagens” bastante comuns na vida das mulheres. Trata-se de alterações benignas formadas a partir de tecido muscular liso do útero feminino. Segundo dados estatísticos, atingem cerca de 50% das mulheres na faixa etária dos 30 aos 50 anos.

Não se sabe ao certo porque o mioma uterino se forma, mas hipóteses do ponto de vista da medicina convencional apontam para alterações genéticas, fatores hormonais e outros fatores de crescimento (substâncias que ajudam o corpo a manter os tecidos podem afetar o crescimento dos miomas).

Pela visão holística da Ginecologia Natural, os miomas são pura energia estagnada, que pode ser de diferentes tipos: sexual, energia de cura, fertilidade, criatividade. Normalmente se manifestam em mulheres que possuem dificuldade em aceitar seus próprios dons e fazer florescer as vontades de sua alma, que se transformam em duras pedras no ventre, o lugar onde nutrimos e gestamos a nós mesmas, nossos filhos e nossos talentos (Rio Mulher).

Do ponto de vista da Psicologia, vale a pena refletir sobre quais fatores levaram as mulheres a converter seus dons em ‘duras pedras no ventre’. A primeira que se nos apresenta são obviamente as (re)pressões culturais. Neste caso precisamos distinguir que expressões da natureza feminina são convencionalmente aceitas e quais delas são censuradas.

Segundo Estés (1994), valores podem mudar de uma cultura para outra, colocando, assim, ‘negativos’ e ‘positivos’ diferentes no reino das sombras, mas o fato é que a sombra pode conter aspectos divinos, exuberantes, belos e poderosos da individualidade. Para as mulheres, especialmente, o mundo sombrio1 quase sempre contém modos refinados de ser que são proibidos na sua cultura ou que nela recebem pouco apoio. No fundo do poço da psique de muitas mulheres está a criadora visionária, a astuta reveladora da verdade, a vidente, a que pode falar bem de si mesma sem se censurar, a que pode se encarar sem repulsa, a que se esforça para aperfeiçoar seu talento. Os impulsos positivos ocultos nas sombras da nossa cultura na maioria das vezes estão relacionados à permissão para que a mulher crie uma vida própria, feita à mão (p. 297).

Assim, se não lhe é dada permissão para criar e viver sua própria vida à sua maneira, a mulher pode recuar silenciosamente. Isto porque nem todas têm espírito aguerrido (não possuem ascendência taurina) e partem para o confronto com seus opositores. Tímidas, inseguras, dependentes (o regime autoritário gera pessoas assim...), sua necessidade primeira é a de se sentir aceita. A ‘menina boazinha’ vem em sua ‘salvação’, mas o preço a ser pago é muito alto. Para ser a ‘menina boazinha’, ela vai precisar renunciar a tudo aquilo que jorra espontaneamente de dentro de si, já que o diferencial da ‘boa’ mulher consiste em viver para os outros e atender as necessidades de outrem.

Uma mulher pode, desta forma, selar o seu destino quando faz a ‘opção’ de ser na vida uma pessoa mediana ao invés de brilhante (mesmo tendo o potencial para), porque não se sente à vontade com o seu próprio brilho, não se sente à vontade em se destacar ou simplesmente porque entende que o seu brilho afeta negativamente os que estão à sua volta. Pessoas medianas precisam de pessoas medianas que pensam como elas e corroboram sua linha de pensamento. Pontos fora da curva incomodam, causam inveja e correm o sério risco de serem proscritos. Desta forma, a mulher acaba se deixando subjugar a uma ordem de coisas que entende ser maior do que ela. Essa conduta, no entanto, representa a morte para a chama dentro de si, pois todo o potencial para o crescimento e a expressão plena de potencialidades é abafado e acaba sendo entorpecido, convertendo-se em duras pedras no ventre.

As duras pedras no ventre de uma mulher - seus miomas - são espectros de tudo aquilo que ela poderia vir a ser, mas a que renunciou.

Entretanto, mesmo petrificados, os anseios na alma de uma mulher continuam clamando pela vida, pois o destino de tudo aquilo que é vivo é dar ampla expressão ao seu potencial - os filhos que não nasceram, os gritos orgásticos que foram sufocados, as obras-primas que foram boicotadas, todas as sementes que não germinaram continuam clamando desesperadamente por forma e substância... Trata-se de uma vida na obscuridade, que resiste bravamente e insiste buscando os caminhos da fertilidade, um veio de água que seja, um raio de sol, que façam brotar a semente que jaz esquecida na nesga da pedra. A alma de uma mulher com miomas grita por vida, fluidez, sensualidade e alegria (Rio Mulher).

O processo de cura inicia-se a partir do momento em que a mulher consegue identificar de que forma está bloqueando e reprimindo sua energia, para deixá-la finalmente fluir. Segundo Estés, os instintos não recuam sem antes deixar ecos e rastros de sentimento, que podemos seguir para resgatá-los.

Tal como o irromper da semente, o processo de cura parte de dentro para fora; a mulher precisa despertar para aquilo que sempre foi e precisa fazer um gesto por si. Ela precisa se permitir ser e definitivamente pôr fim:

  • Às dúvidas relativas aos seus dons e à sua capacidade;
  • À sabotagem do seu sucesso por conta do medo;
  • À conduta de esconder quem é para o mundo.

Assim agindo, conseguirá interromper e fazer cessar uma prática compulsiva de maus-tratos auto impingidos e uma falta de consideração por si. Ser capaz de emitir um gesto de aceitação que seja e saber que seu produto é bom e que o mundo precisa dele, é um ato de generosidade e gentileza para consigo mesma. Ao fazer isso, estará fazendo um bem para si e para o mundo.

A crescente aceitação de si faz com que a aceitação do outro se torne secundária. Note-se ainda que, na obscuridade do ‘cativeiro’ a que a cultura lhe relegou, lentamente foi sendo engendrada uma altivez e uma firmeza d’alma que fez com que a timidez simplesmente evaporasse. Para sua surpresa, a mulher se vê de repente em um radiante despertar, vibrando em uníssono com todos os elementos:

Sou toda minha ancestralidade, em mim!
Sou toda a força que me move, a partir de mim!
Sou toda beleza que me cerca, espelho de mim!
Sou toda canção que ressoa, canto do meu eu!
Sou todas as cores que reluzem, o brilho em mim!
Sou a paz do silêncio, que silencia em mim!
Sou o calor do fogo sagrado, que queima em mim! Sou o ar que sopra a vida, brisa em mim!
Sou a água que nutre a vida, fluo em mim!

Rose Kareemi Ponce (Rio Mulher)

Nota

1 Segundo a Psicologia Analítica, a repressão de sentimentos, instintos e impulsos tanto negativos quanto positivos, forçando-os para o fundo do inconsciente, faz com que eles ocupem o reino da sombra (Estés, 1994, p. 296).

Referências

ESTES, Clarissa Pinkola. Mulheres que Correm com os Lobos: mitos e histórias do arquétipo da mulher selvagem. Rio de Janeiro, Editora Rocco, 1994. 627 p.

Fontes

Mioma uterino: sintomas, tratamentos e causas. Minha vida.
Grupo de estudos Sagrado Feminino, Rio Mulher.