Peregrinação é uma obra literária pertencente à chamada literatura de viagem, próxima do que se poderia chamar crónica de viagem ou diário. É o livro de viagens da literatura portuguesa mais traduzido e famoso. Foi publicado em 1614, pelos prelos de Pedro Crasbeeck, trinta anos após a morte do autor.

O livro, organizado por Frei Belchior Faria, fora publicado com o seguinte título (na íntegra e em português clássico): "Peregrinaçam de Fernam Mendez Pinto em que da conta de muytas e muyto estranhas cousas que vio & ouvio no reyno da China, no da Tartaria, no de Sornau, que vulgarmente se chama de Sião, no de Calaminhan, no do Pegù, no de Martauão, & em outros muytos reynos & senhorios das partes Orientais, de que nestas nossas do Occidente ha muyto pouca ou nenhua noticia. E também da conta de muytos casos particulares que acontecerão assi a elle como a outras muytas pessoas. E no fim della trata brevemente de alguas cousas, & da morte do Santo Padre Francisco Xavier, unica luz & resplandor daquellas partes do Oriente, & reitor nellas universal da Companhia de Iesus."

Pesavam contra a obra o grande distanciamento temporal e as drásticas mudanças no cenário oriental que Fernão Mendes presenciara e o daquele momento, com as fortes presenças dos ingleses e holandeses na região. Além disso, seus escritos fariam concorrência com autores muito mais recentes e eruditos, como João de Barros, Luís Vaz de Camões e Fernão Lopes de Castanheda. A Peregrinação deixara de tratar de um assunto de momento para se tornar a descrição de um tempo passado.

Contrariando as expectativas, a Peregrinação torna-se um sucesso, recebendo 19 edições em seis línguas. Abrem-se imediatamente discussões a respeito da veracidade dos eventos narrados. Essa questão é trabalhada por autores como P. G. Adams, Mary Campbell, Maurice Collis e A. Pagden, não se limitando apenas à Peregrinação, mas abrangendo o género de relatos de viagem como um todo. Serão levantadas dúvidas e questionamentos que resultarão em uma delimitação mais profunda entre o registro histórico e a ficção.

Percebe-se com isso uma clara mudança nos referenciais da narrativa, não mais os mesmos pelos quais Mendes Pinto se pautava. Já não era mais suficiente para o leitor desse tempo a alegoria medieval. Ele agora exigia uma factualidade efectiva e comprovável, pois ele sentia-se estimulado a ir ver por conta própria essas terras desconhecidas e explorar suas riquezas. Nesse contexto, a precisão do testemunho ocular fazia-se fundamental.

Biografia
Fernão Mendes Pinto (1510 - 1583) foi um aventureiro e explorador português. A sua vida pode ser entendida como estando dividida em três fases. Uma primeira, narrada sucintamente no primeiro capítulo de Peregrinação, compreende a sua infância, adolescência e juventude, vividas em Portugal; na segunda fase da sua vida, Fernão Mendes Pinto viaja em busca de fortuna, entre 1537 e 1558, pelos mares da Arábia, da Etiópia, Índia, Samatra e Japão; o regresso a Lisboa, oriundo da Índia, em 1558 marca a terceira fase da sua vida.