Começou 2019. Muitas resoluções: aprender aquele idioma, perder peso, ir na academia, mais tempo livre e menos estresse. Além dessa lista que sempre se repete, aqui em casa repetimos outro ritual: o desapego. Só que esse ano eu comecei pela minha papelada e resolvi dar espaço aos novos livros comprados em 2018. Como o tempo e o espaço não são multiplicáveis, lá fui eu garimpar o que eu poderia simplesmente viver sem. Livrei-me de papeis (imagine o acúmulo de anotações e post-its de alguém que tinha terminado um doutorado de 4 anos há poucos meses!) e também de livros.

Durante as minhas assíduas viagens até a estação de trem de Santo André às quartas, percebi que logo na saída da estação havia um caixote de madeira com livros e revistas usados e nessas caixas estava estampado como um carimbo o imperativo “Livre-se”. Logo percebi que poderia haver um duplo sentido nisso. O ato de livrar-se de algum livro ou revista já lidos e também um neologismo que dá conta do ato de ler e se instruir como um verbo reflexivo. Achei genial e resolvi que gostaria de me livrar dos livros de forma a deixar meus livros livres para que fossem para mãos de usuários do trem.

Lá fui eu um dia com uma sacola cheia. Ainda bem que naquele dia os caixotes estavam quase vazios e os meus livros rechearam suas duas partes. Depois fiquei um pouco distante para ver a reação das pessoas e logo, menos de 2 minutos, um senhor e um jovem pararam diante da caixa. Não resisti e fui até lá. Papo vai, papo vem e o senhor diz que sempre fica de olho nos livros, lê as primeiras linhas e se gosta, leva. O rapaz nunca tinha pego nenhum, mas ambos saíram de lá com alguns dos livros. Até um em alemão! Fui para casa mais leve literalmente e com a alma feliz por ter feito alguma coisa boa nessa nossa região tão carente de cultura e de bibliotecas.

Chegando em casa, tive a ideia de pesquisar qual era a iniciativa e me dei conta que fiz um pequeno desvio na ideia original. O Livre-se é um projeto da Casa da Joanna [trans]formação educativa. O seu intuito é estimular o hábito de leitura na cidade promovendo o empréstimo gratuito de livros para todos, por meio de livros colocados em caixotes de madeira e distribuídos em vários estabelecimentos de circulação pública.

Todos podem pegar os livros emprestados sem cadastro e após a leitura, a devolução pode ser feita no mesmo caixote ou em outro ponto participante do projeto. Para os organizadores o principal é compartilhar a experiência de leitura e indicar o livro na página do projeto no Facebook para que outros tenham vontade de ler. Eu acabei atropelando as etapas, pois deveria ter feito a doação para eles inserirem os livros no acervo e não ter colocado direto no caixote. Entretanto, se houvesse algum aviso próximo ao caixote, certamente eu teria feito o processo direito. Bem, de qualquer maneira, acho que mesmo não tendo feito corretamente, os meus livros chegaram a outras mãos e que elas possam passar esses mesmos livros para outras e assim sucessivamente. Ao invés de ter esses livros aprisionados sem leitura, eles ganharam vida em outros lares.

Em 2019, livre-se dos dois jeitos para dias melhores e para uma sociedade melhor!