Quem não conhece Paris? A cidade das luzes, cheia de movimento, repleta de gente, o burburinho constante da azáfama de quem lá vive ou de quem a visita. Uma cidade para durar no tempo, uma memória da grandeza das ideias do povo que a construiu.

Pois bem, eu não conheço Paris, conheço sim a versão pós-apocalipse da capital francesa. Imaginem-se num filme de zombies, numa terra que sobreviveu às guerras nucleares e ao vírus que dizimou grande parte da população mundial.

Esta é a visão que se tem quando se chega a Tianducheng, cidade fantasma nos arredores de Hangzhou. A cidade-réplica, pós-apocalíptica, de Paris na China.

Tianducheng fica nos arredores de Hangzhou, a próspera capital da província de Zhejiang, cidade onde vivi durante seis meses.

A construção da área residencial iniciou-se em 2007, e muito se especulava que iria terminar em 2015. Pois bem, não vai acabar nunca, está votado ao fracasso. No projecto estava a construção de um luxuoso empreendimento urbanístico de características similares à cidade de Paris, assim como existem outras cidades e zonas urbanísticas criadas à imagem de outras capitais europeias.

É chique, está na moda, e o chinês com dinheiro adora tudo o que vem e tudo o que é vendido na Europa, mesmo que seja fabricado na China.

Quem chega a Paris da China, depara-se com várias similaridades arquitetónicas com a cidade francesa.

Tianducheng conta com a réplica da Torre Eiffel, a fonte dos jardins de Luxemburgo, uma praça chamada de Champs Élysées, edifícios habitacionais semelhantes aos do centro parisiense e vários jardins, as semelhanças ficam por aqui.

O empreendimento residencial foi projectado para receber mais de 10.000 habitantes, vários negócios, serviços e atividades que atraíssem trabalhadores e visitantes. No entanto, as ruas estão completamente desertas, vazias de movimento. Cerca de 2000 pessoas vivem a tempo inteiro nos apartamentos e o maior movimento que existe nas ruas são dos curiosos ou de noivos que aproveitam o cenário romântico de Paris para fazer sessões fotográficas.

Quem mais usa o local são os pobres agricultores das áreas circundantes que vieram à procura de algo melhor, os espaços que deveriam ser jardins ou algo mais, são agora campos de milho e arrozais.

A Torre Eiffel serve apenas de vista para aqueles que moram em barracos de madeira cobertos com chapas de zinco à sombra de apartamentos por estrear. Vivem do pouco que plantam, de baozis e das bugigangas que conseguem vender aos turistas.

Uma cidade projetada para brilhar, como a original, acaba por ser um deprimente destino turístico. Assim como Paris é a cidade das luzes, capital do romance e popular destino de compras, os investidores chineses pensavam que construir uma cidade na periferia da movimentada e cosmopolita Hangzhou fosse uma ideia brilhante.

No entanto, uma zona rodeada por montanhas, sem indústria, má acessibilidade, défice de estruturas capazes de promover empregos e a inexistência de redes socioeconómicas que sustentem as necessidades daqueles que lá moram, tudo isto é receita para um desastre anunciado. Mas afinal, quem quer viver no meio do nada?

É fácil compreender a vontade do Governo Chinês em aliviar a pressão demográfica presente nos grandes centros urbanos. Ao construir estas cidades fora desses centros urbanos cria novas zonas para aqueles que procuram novas oportunidades de vida. Alivia pressão populacional de um lado e devolve população às zonas da China, carentes dela.

Contudo, estudos devem ser feitos e as necessidade devem ser analisadas. Tianducheng é somente mais uma prova dada da má análise do mercado imobiliário, do excesso de oferta e da falta da perceção real sobre a pobreza existente na China. No fundo é um problema recorrente da bolha imobiliária chinesa.

Para a grande maioria dos chineses adquirir uma apartamento em Tiangducheng é impossível, o mercado habitacional na China não está regulado pela realidade do poder de compra dos chineses, quem compra apartamentos nestes espaços são pessoas que já têm outras casas, compram apenas para investir. A dificuldade que os chineses têm para mover dinheiro para fora da China é muito grande, logo o investimento imobiliário é algo comum, muitos vêm como um investimento seguro a 20 ou 30 anos.

A construção imobiliária cria a falsa ideia de crescimento económico. Conforme o consumo interno chinês vai crescendo, cresce também a necessidade e a procura interna. No entanto, a procura e a oferta estão abissalmente desfasadas.

Estima-se que existam mais de 64 milhões de casa vazias em toda a China, a cada ano mais projetos habitacionais são criados e cidades são criadas de raiz, de forma a satisfazer a procura que tende a ficar aquém do suficiente para oferecer/vender.

Enquanto isso, para aqueles que estão com dúvidas entre visitar Paris ou Shanghai, é fácil. Podem vir a Shanghai, conhecem uma das cidades mais incríveis da China, sensivelmente a uma hora e meia de Hangzhou, a cidade romântica chinesa e considerada por Marco Polo, o paraíso na Terra, e a dois passos de Paris… da China. Uma viagem para a vida!