δῶς μοι πᾶ στῶ καὶ τὰν γᾶν κινάσω.
Give me the place to stand, and I shall move the earth/world.
Dê-me uma alavanca e um ponto de apoio e levantarei o mundo

(Arquimedes de Siracusa)

Nas margens do panorama de avaliação dos docentes e investigadores, como borboletas em torno de uma chama já sem o prometeico élan, as novas gerações resistem em busca do sonho profissional que o valor as fez conceber, ou procuram-no lá fora. Com precárias bolsas ou outras formas precárias de manutenção, em avaliação permanente… não anunciam a festa da natalidade que revitalizaria a sociedade, daria esteio aos mais velhos, sustentaria a vida. Que futuro para todos nós? Que futuro para as instituições, as nações, os continentes…? Que futuro para a memória que nos constitui identitariamente, do(s) indivíduo(s) à(s) comunidade(s)?

Da licenciatura…

De acordo com o estudo Diplomados com o Ensino Superior (dados e projeções) da DGEEC, o panorama geral relativamente ao qual se fazem projecções de cenário “optimista” e “pessimista”, é: Figura 1.

Trata-se de projecções que, mesmo no caso do “cenário optimista” estão abaixo do objectivo EU2020 acordado (40%) por duas razões: decréscimo de diplomados nas idades em análise e sua elevada emigração. Será, pois, ao nível destas razões que se deverá intervir para se obter a desejada convergência até 2020, como conclui o estudo.

… ao mercado de trabalho

Façamos parênteses para ver qual a recepção destes diplomados no mercado profissional. Os indicadores de caracterização dos desempregados registados com habilitação superior em dezembro de 2014 apresentavam o seguinte panorama de desemprego com valores muito semelhantes em todas as áreas científicas: Figura 2.

Em 2016, uma infografia do jornal Expresso, mostrava esta situação por áreas disciplinares: Figura 3.

É neste cenário de dados e projecções que passaremos a observar a distribuição do apoio institucional no plano das bolsas, necessidade identificada e reclamada.

Das Bolsas

Bolsas de estudo & de mérito

Sobre as bolsas de estudo e de mérito para as licenciaturas e mestrados, remeto para estudos divulgados na comunicação social.

O quadro de possibilidades no ensino superior é assim infografado em 2014: Figura 4.

Este quadro justifica, até, “Grupos de Entre e Ajude” (grupos que, quando clicamos sobre a imagem, não mais se encontram…):Figura 5.

Quanto aos resultados dos pedidos de Bolsa Social em 2016, o cenário é Figura 6.

O panorama de 2016 apresentado pela DGES é: Figura 7.

Bolsas de Doutoramento e Pós-Doutoramento

Foram divulgados recentemente os resultados dos concursos das Bolsas para Doutoramentos e pós-Doutoramentos de 2017. Resultados recebidos com dramatismo pelos candidatos, na sua maioria, com o futuro completamente dependente dessa decisão.

E, mais uma vez, verificaram-se grandes assimetrias, com consequentes prejuízos de candidatos, áreas disciplinares e instituições.

Senão, vejamos apenas alguns indicadores mais óbvios de assimetrias:

• por nível de formação: foram recomendadas para financiamento 1200 bolsas, sendo 800 de Doutoramento e 400 de Pós-Doutoramento;

• por desdobramento de áreas disciplinares apenas em ciências, como é o caso da Biologia e da sua associação às tecnologias (Bioengenharia e Biotecnologia, Biologia Experimental e Bioquímica, Biomedicina e Medicina Básica, Ciência Animal e Ciências Veterinárias, Ciências Biológicas, Nanotecnologia) ou de Engenharias (Engenharia Civil, Engenharia do Ambiente e Biotecnologia, Ambiental, Engenharia dos Materiais, Engenharia Eletrotécnica, Eletrónica e Informática, Engenharia Mecânica, Engenharia Química), em contraste com Arte e Estudos Literários.

Assim:

• ou os estudiosos de formação avançada perdem qualidade ao progredir na investigação, justificando a quebra de 50% no número de bolsas atribuídas, o que não será razoável pensar-se, ou houve uma divisão do financiamento disponível, à partida, diferenciadora, o que configuraria uma discriminação negativa do nível mais elevado;

• a tipologia revela bom conhecimento de algumas áreas disciplinares das ciências, conseguindo desdobrá-las, e mau conhecimento de alguma outras áreas das humanidades, que não consegue desdobrar (Estudos Literários, p. ex.);

• a tipologia revela, também, que não se salvaguarda a possibilidade de, por esse desdobramento, se beneficiarem áreas disciplinares em detrimento de outras, nem sequer a equitatividade entre as áreas disciplinares propostas (mesmo na sua convicção, discutível, de que se trata de uma tipologia aceitável).

Se reunirmos apenas alguns indicadores das áreas desdobradas e das não desdobradas e os cruzarmos com a velha distinção entre Artes & Letras vs. Ciências, eis-nos com uma assimetria entre elas (56 vs. 246) que nem a realidade cultural do país, com riquíssimo, multicultural e multisecular património cultural, nem o mercado de trabalho parecem justificar: Quadro

Se fizermos uma leitura apenas da variação quantitativa por disciplina da tipologia avaliada, verificamos mais assimetrias no exercício de avaliação que não podem ser sempre explicadas pela diferença disciplinar nem outra:

• as bolsas de doutoramento variam entre 3 (Matemática) e 48 (Engenharia Eletrotécnica, Eletrónica e Informática) atribuídas;

• as de pós-doutoramento variam entre 1 (Direito) e 28 (Ciências Biológicas) atribuídas;

• o conjunto das 2 tem uma amplitude de variação entre a atribuição de um total de 8 (Linguística, Comunicação e Gestão de Ciência) e de 68 (Ciências Biológicas);

• pouquíssimas disciplinas apresentam o mesmo número de bolsas nos 2 níveis (Ciências da Terra, com 11 em ambos, e História da Ciência e Tecnologia e Outras Humanidades, com 4 em cada);

• algumas apresentam desequilíbrios enormes entre ambos os níveis (Direito, com 15 e 1; Engenharia Eletrotécnica, Eletrónica e Informática com 48 e 13; Ciências da Educação com 41 e 8).

Conviria

• saber se há condicionantes de mercado e/ou do sistema que expliquem a óbvia diferença entre níveis e entre áreas disciplinares;

• observar o exercício de cada avaliador, cruzando-o com o dos outros e com o da média da avaliação produzida;

• se, quando e como há avaliadores a avaliar candidatos de unidades a que eles mesmos estão vinculados, ou seja, se foram devidamente acautelados os conflitos de interesses;

• ponderar quais as instituições mais representadas nas candidaturas aprovadas e se elas estão também maioritariamente representadas nos júris.

E convirá, por fim, observar os recursos/contestações, a quem são dirigidos, quem os avalia (por vezes, a instância de recurso é a mesma que classificou…) e a taxa da sua aceitação, com alteração da avaliação.

Antes, no Ensino Secundário

Entretanto, olhemos mais para baixo, para o ensino secundário português. Façamo-lo através dos resultados de Portugal no Programme for International Student Assessment (PISA) e no TIMSS & PIRLS 2015 e 2016:

• com 70 países, Portugal é o 23º, acima da Áustria, Estados Unidos e Noruega;

• Portugal mantém uma progressão e um grande equilíbrio entre as áreas avaliadas: ciência, leitura e matemática. Em 15 anos, as linhas no gráfico são ascendentes e quase paralelas: Figura 8.

É um panorama saudável no plano do conhecimento e das suas áreas, panorama que, mais uma vez, contraria o da assimetria na concessão de bolsas que observámos atrás, no nível de formação mais elevado (doutoramento e pós-doutoramento).

Ora, se a nível do secundário, desde 2000, houve melhoria e paralelismo na aprendizagem, por que razão os resultados a nível superior (doutoramento e pós-doutoramento) apresentam um gráfico assimétrico entre áreas e com perda de qualidade à medida que se ascende no nível de formação (doutoramento e pós-doutoramento)?

Bolsas de Investigação Científica

Na esfera dos centros de investigação.

Das candidaturas dos projectos…

No seio do labirinto burocrático brevemente esboçado no texto anterior.

…às dos jovens investigadores

As dificuldades enfrentadas pelos bolseiros, antes, durante e após as bolsas, conduziram à criação da ABIC – Associação dos Bolseiros de Investigação Científica com site, fórum, blog, inquéritos e guia. Remeto para lá quem queira informar-se sobre as diferentes equações dos seus problemas.

Os Concursos para atribuição de Bolsas de Investigação no âmbito do COMPETE 2020, de actualização semanal, apresentam um panorama de complexidade correspondente ao dos projectos de investigação candidatados concretizado num quadro que também “não dispensa a consulta ao site da FCT e ao site eracareers”, e que recomenda o uso das “palavras-chave para pesquisa: COMPETE 2020, Compete 2020, POCI, ou a ref.ª da Bolsa”. Enfim, mais um labirinto para experts… quanto aos resultados, quer da conquista da almejada bolsa, quer do que representa esse estatuto de bolseiro de investigação científica, remeto para os protestos que a sua precaridade tem motivado desde 2006, multiplicados na comunicação social.

Identificados os problemas, porque continuar com os mesmos padrões de avaliação?

Em tempo de “Crepúsculo das Humanidades” (George Steiner), está na altura de “repensar criticamente a docência e a pesquisa” (Paulo Ferreira da Cunha), de nos reinventarmos, ou, na expressão de Wole Soyinka, no seu já referido keynote speech, de “re-imaginar a futura universidade”, dotando-a desse “humanismo” de que a vê esvaziar-se, da dimensão de sonho, começando pela redução de burocracia, valorizando os seus recursos humanos, dando-lhes tempo e liberdade para inovar, abrindo-a à renovação geracional e à cumplicidade intergeracional. Foi por aí que se fez o século dos génios (Alfred North Whitehead) e se produziu o “efeito Medici” (Frans Johansson)… “porque temos de ser fabricantes da inovação” (Paulo Maria Bastos da Silva Dias), é a nossa condição de seres no tempo.

δῶς μοι πᾶ στῶ καὶ τὰν γᾶν κινάσω.
Give me the place to stand, and I shall move the earth/world.
Dê-me uma alavanca e um ponto de apoio e levantarei o mundo

(Arquimedes de Siracusa)

Referências das Figuras

Figura 1: Diplomados com o Ensino Superior (dados e projeções), estudo da DGEEC.
Figura 2: «Comparação dos valores dos desempregados registados com habilitação superior com indicação de par estabelecimento/curso com os desempregados registados com habilitação superior com indicação de par estabelecimento/curso válido, por área de estudo». Vid.. Antes, até 2013, cf..
Figura 3: «Há dados atualizados para ajudarem pais e alunos a escolherem os cursos com menos desemprego», Expresso, 17 de Junho, 2016.
Figura 4: Aqui.
Figura 5:Aqui.
Figura 6: Aqui.
Figura 7: Aqui. Figura 8: Video, Expresso, 19 de Janeiro, 2017.