Há alguns dias, perdi uma grande amiga, daquelas que transforma a vida das pessoas que por ela passam durante sua existência. Guerreira, empoderada e acima de tudo, livre para ter sido quem foi. Uma perda irreparável que jamais irei superar.

Durante sua despedida, ouvi ao longe seus parentes preocupados com o que diriam ao seu pequeno neto de três anos que indagava por sua ausência cotidiana.

Que difícil, diga que a vovó virou estrelinha e está no céu.

Foi o comentário geral.

Ao chegar em casa, uma aflição não me saia do pensamento: por que tratamos os sentimentos das crianças como algo que não exija explicações? O luto é sempre muito doloroso independente da idade, no entanto, evitamos o assunto e as explicações para as dúvidas quando o luto está vinculado às crianças.

Mesmo após o período pandêmico em que a morte foi tema cotidiano nas escolas e na programação aberta de televisão, portanto, sendo de acesso a todos, o tabu em torno do tema é algo que não foi discutido nem no ambiente familiar e nem nas instituições escolares, perpetuando a ideia de imortalidade do ser humano.

Porém, como nós adultos bem sabemos, somos efêmeros e pereceremos. Mesmo como o avanço tecnológico da ciência e da medicina preventiva, dos medicamentos e dos dermocosméticos tão consumidos nos últimos tempos, um dia partiremos e não sabemos para onde.

Então, como devemos preparar as crianças para este momento que nem mesmo os adultos compreendem ou aceitam de forma racional?

Até os seis anos de idade a criança ainda vive entre o que imagina e a realidade, segundo estudos realizados por Fávero e Anton em 2010, na primeira infância os pequeninos podem considerar que a morte é uma punição por algo que fizeram. Então, como devemos tratar do assunto de forma lúdica, mas ao mesmo tempo com sinceridade? Vejamos:

  • Não invente conceitos abstratos para a partida: Como vimos anteriormente, usar metáforas como “o vovô foi morar no céu” ou “a vovó está dormindo”, tornam o entendimento difícil para a criança. Até os 6 anos, as funções cognitivas que nos permitem diferenciar o real do irreal ainda não são maduras o suficiente, assim os pequeninos acabam por entender que depois de um tempo, o vovô voltará do céu quando o passeio ou a viagem acabar;
  • Use o verbo morrer para contar a verdade, assim como a função cognitiva sobre real e irreal está se formando, o vocabulário também, explique que morrer é uma ação que não pode ser revertida;
  • Mesmo com todas as explicações possíveis, a criança necessita de constantes reafirmações, portanto, ela irá perguntar diversas vezes sobre o acontecimento e sobre a ausência do ente querido. É importante manter a coerência dos fatos descritos;
  • Alguns especialistas defendem que a criança deve participar de todo o processo de despedida (velório, enterro,) e outros defendem que estes processos podem gerar mais dúvidas que esclarecimentos. Eu, particularmente, acredito que cada família deve optar pelo que acha que fará mais sentido de acordo com seus valores, credos, religiões etc;
  • Não tente ser especialista no assunto, se a criança indicar outra explicação que faça sentindo a ela, diga a verdade de que ninguém tem respostas concretas sobre o pós-morte;
  • Faça deste momento uma fonte de carinho e respeito, pois mesmo sem compreender o que de fato possa ter acontecido, a criança tem sentimentos e sofre tanto quanto os adultos pela ausência do ente que se foi;
  • Por fim, não trate a criança como um miniadulto. Embora jovem, uma criança pode ter sentimentos concretos e uma forma singular de demonstrar seus sentimentos, medos ou angústias.

De fato, ninguém está preparado para uma perda, ainda mais quando esta perda é repentina, quiçá, uma criança que mal sabe qual é o seu lugar no mundo. No entanto, temos a obrigação de orientá-la e permiti-la vivenciar o luto de sua forma.

Para nós adultos que entendemos a situação, mas muitas vezes não a compreendemos ou não a aceitamos, resta-nos lembrar dos bons momentos vividos e perpetuar a imagem daquela pessoa querida em nossas lembranças.

Tenha a vida a continuação pós-morte ou não, no meu coração, minha amiga, assim, como todos as pessoas que passaram em vida por mim, estarão sempre vivas no meu coração.