Da tradução clássica do sânscrito como círculo da essência até a concepção do psiquiatra suíço C.G. Jung como símbolo do self e totalidade da psique, as mandalas viajam por culturas várias e podem ser consideradas uma imagem simbólica do Universo.

Sem começo nem fim,
a natureza do Universo é circular.

As mandalas estão presentes nas manifestações culturais ancestrais. Nas tradições Hinduísta e Budista fazem parte dos seus rituais de conexão com o sagrado. Como guia de interiorização, leva a meditações profundas para alcançar a paz interior. São também compreendidas como fonte de cura, uma vez que a contemplação inspira serenidade, equilíbrio das emoções e, consequentemente, ajuda nos processos físicos com a redução do estresse.

As mandalas são círculos geométricos que representam a totalidade e a integridade natural. O círculo é a forma perfeita, uma das imagens primordiais da humanidade e ao considerarmos esta simbologia percebemos que nós também somos este círculo, uma vez que não somos dissociados da natureza.

A natureza é mandálica, basta prestar atenção na formação de todos os inícios - a partir de um núcleo central circular - desde os átomos até as infinitas galáxias. Jung entendia que a mandala é uma representação simbólica do átomo nuclear da psique humana. Poeticamente, as flores são padrões de mandalas assim como nossos olhos – as janelas da alma. Podemos sentir a delicadeza da afirmação de que vemos o mundo através de mandalas.

Círculos Mágicos

O ponto e a curva
Fora e dentro
O tudo e o nada
O infinito
Nós

Jung utilizou o termo e a representação artística circular de cultuação e contemplação das culturas orientais para expressar o self e a totalidade da psique1, incluindo o relacionamento do homem com o mundo ou o cosmos. Observou que ao fazer desenhos circulares - as mandalas - ele mesmo, e depois, ao propor para seus pacientes, pôde estabelecer e compensar desordens e perturbações psíquicas, ou seja, a mandala torna-se o arquétipo da ordem, da integração e da plenitude psíquica. Uma tentativa de autocura através do espelho.

Ao desenhar uma mandala, harmonizamos algo dentro de nós, pois unimos e integramos as nossas partes, possibilitando transformação. É um desenho de conexão e movimento: nos conecta com o nosso centro e ao mesmo tempo abre possibilidades e perspectivas transpessoais, coletivas, cósmicas.

Nossa relação com o mundo se dá através das mandalas quando nos colocamos em harmonia com o círculo, assim compreendemos mais e temos mais flexibilidade na vida. Esta relação se dá a partir da nossa relação conosco mesmos e as mandalas expressam o nosso mundo interno e tudo aquilo que não alcançamos com as palavras. É uma linguagem imagética onde os símbolos2 nos reconciliam com o universo. Simbolizar é imprescindível para o equilíbrio interno.

Desenhar mandalas resulta em imagens impregnadas de cargas afetivas e emocionais inconscientes que projetamos no desenho. É a dinâmica de busca da união dos opostos (masculino/feminino, direita/esquerda, par/ímpar, vida/morte...).

Mandalas e autoconhecimento

A primeira função da mandala, do ponto de vista terapêutico e de autoconhecimento, é promover equilíbrio - contemplar uma mandala nos remete para uma noção de equilíbrio - e também faz refletir: quem sou eu dentro desse círculo?

Os livros de colorir, do ponto de vista de interiorização espiritual, podem não dizer nada sobre si mesmo, de toda forma quando pintamos uma mandala entramos em estado meditativo, de conexão e alcançamos silêncio interno, ou pelo menos é possível se aproximar desta possibilidade e perspectiva.

Na jornada que fazemos para dentro, na busca pelo autoconhecimento, a mandala deixa de ser um círculo e passa a ser um círculo sagrado.

O círculo representa o si mesmo e o universo que o rodeia. A mandala sagrada está dentro. Quem não admite a vida como um grande círculo está fadado ao sofrimento, pois além do movimento do centro para as extremidades e destas novamente para o centro, há os ciclos. A vida é feita de ciclos, uma outra dimensão do próprio círculo.

Hoje, as pessoas, de um modo geral, não sabem onde estão seu ponto central (essência), é preciso entender a relação entre o mundo externo e o Eu.

Toda mandala tem de ter definido o fora e o dentro, o ponto e a curva. O movimento é: vou de meu centro ao mundo e volto. Este movimento é o que nos faz. Quando eu deixo de ser o ponto central da minha vida, eu não consigo ver quem sou. Para refletir:

  • Como anda o meu mundo em relação ao mundo?
  • O meu centro está no centro da minha vida ou na vida do outro?
  • Estou agindo no mundo de acordo com quem sou?

Terapeuticamente, as mandalas auxiliam nesse movimento de subjetividade, da individuação, do encontro com a estrutura pessoal.

A arte das mandalas

Tanto contemplar quanto pintar mandalas - como elemento artístico - desenvolve e aumenta a criatividade, foco, concentração e equilíbrio.

As mandalas que são usadas em caráter decorativo também possuem magia. Além da beleza e estética, elas nos levam para o seu centro. Como ímãs somos atraídos para o seu núcleo central como se buscássemos a nós mesmos, como se quiséssemos encontrar o nosso círculo sagrado.

Já que em todo centro há outro centro,
só nos resta dançar em círculos
em torno desse grande mistério que é a totalidade.

(Caio Felix)

A arte de conhecer a si mesmo - muito antes de Delfos - reconhecida como sabedoria ancestral, tem nas mandalas um instrumento de conexão com o divino, promovendo a concentração necessária para chegar ao silêncio profundo e realmente conhecer a real e verdadeira essência do ser – a integração com o Todo. Jung, o pai da psicologia analítica, estudou este conceito e o percebeu como o próprio humano, que dança em seus antagonismos em busca do seu centro e da totalidade. A mandala é a música do mundo interno e em sua partitura está a energia vital de cada um.

Notas

1 Self ou si mesmo expressa a totalidade do homem, é o centro da personalidade e a partir dele é possível impulsionar naturalmente para as vivências do potencial humano e desenvolver a personalidade genuína em seu processo de individuação. Para Jung a mandala representa o processo psíquico de individuação.
2 A palavra símbolo na sua etimologia - sinnbild em alemão – significa unificação de pares opostos. Este movimento é fundamental no processo de amadurecimento e integração do ser.