Pequenas entrevistas podem revelar, a partir do relato da experiência, a maneira como se configura a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), realizada no Brasil, no estado do Rio de Janeiro, desde 2003. Com isso em mente, entrevistei três poetas mulheres que estiveram na cidade, em 2023, no intuito de perceber como se constitui o evento, a partir da vivência das poetas que caminharam por suas ruas, encontrando a poesia, assim como outras formas literárias e outras artes, em diversos momentos e locais. A primeira poeta entrevistada foi Jane Christina Pereira, doutora em Teoria Literária pela Universidade estadual paulista (Unesp), autora do livro de crítica Da boca do lixo ao indizível: as narrativas poéticas de João Antônio em Malaguetas, Perus e Bacanaço e de livros de poemas. Agora, converso com Lilian Escorel.

Poeta, professora e tradutora, Lilian Escorel é doutora em literatura brasileira pela Universidade de São Paulo (USP), instituição em que realizou o Mestrado e a graduação em Letras, francês. Além disso, foi finalista no prêmio Off-Flip do ano de 2017 (uma premiação literária que estimula desde 2006 a criação de arte em língua portuguesa) com o poema Travelling, e participou da antologia Um girassol nos teus cabelos – poemas para Marielle Franco, com o poema Naquele rio.

O que significa encontrar a poesia, quando se percorre as ruas da cidade e os eventos, na Feira Literária Internacional de Paraty?

Para mim, o encontro com a poesia nas ruas de Paraty (Rio de Janeiro, Brasil) se dá sobretudo como descoberta. Viagem a uma vila histórica, pequena, que durante quatro ou cinco dias promove faíscas e explosões, juntando gente, muita gente. E livros, livros a mancheias.

No sentido lato, a poesia já está no mapa traçado para a festa em torno da literatura e de uma escritora ou um escritor homenageado. Instaura-se um clima de magia pela própria paisagem da vila e pela grandeza do evento, que reúne gente do país e de fora, interessante e interessada na comunhão com a palavra impressa e vocalizada.

No sentido estrito, a poesia se oferece nas ruas, nos auditórios e nas casas-parceiras. A cada ano mais, como reporta a chamada de capa do caderno especial do jornal O Globo, em 24 de novembro de 2023, circulando exclusivamente em Paraty na vigésima primeira edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip):

Festa que sempre atraiu poetas a Paraty, a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) traz, em 2023, uma programação que abre mais espaço para os versos, e privilegia autores brasileiros e estrangeiros que valorizam o diálogo com outras linguagens, como Luiza Romão, vencedora do Prêmio Jabuti de 2022, e a canadense Dionne Brand.

Fora do mainstream, a poesia se mostra em abundância. Num cenário assim de elevada concentração humana e literária, as experiências e os assombros poéticos estouram. Com o mapa e o programa em mãos, disparo minha viagem de descoberta. Mas é preciso estar aberto para que ela aconteça, tanto no plano estudado como no não estudado. Andar-vagar nos caminhos de pedras irregulares da vila e deixar-se achar. Nesse estado de poesia, pessoas, geografias, línguas, sons, sinais imprevistos irrompem pelas vias principais, pelos atalhos e pelas frestas.

Nas quatro edições da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) que fui em 2017, 2018, 2019 e 2023, voltei transformada pela viagem literária e poética, trazendo na bagagem de volta, cadernos rabiscados de notas, listas de nomes, periódicos, plaquetes e livros. Poetas novos e reencontrados, escritores ouvidos no último dia no Sesc Santa Rita, em café literário, “A literatura em estado bruto”, os quais me acordaram para a realidade física e literária do Brasil central: Joca Reiners Terron e Paulliny Tort. Uma memória comovida. Bem nutrida.