Contextualizando: vamos tomar uma xícara de café e conversar?

Em julho de 1988, estava iniciando minha vida na área da saúde, hoje 35 anos depois posso falar que passei por duas pandemias vivo.

O HIV - vírus da imunodeficiência humana e a AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida foi descrito num primeiro momento no final dos anos 70 (1977/1978) e ganhou destaque a parir de 1981 em todo o mundo, alastrando-se pelos 5 continentes, mas, no entanto, o HIV circula entre os seres humanos desde o final do século XIX.

Mas por que falar da AIDS?

Encontrava-me na década (80) em que o vírus estava em latência e matando muitas pessoas principalmente pelo desconhecido. Meu contato com esse público começou exatamente no fim dos anos 80. Então com 18 anos presenciei a morte de muitos pacientes e de colegas de trabalho. O HIV ainda continua fazendo suas vítimas e acredito que tenha e tem ainda matado muito mais pessoas que o Covid-19.

A Pandemia do COVID assolou e assola nessa época um grande índice de mortalidade.

Os profissionais da linha de frente presenciaram o que jamais pensariam viver um dia. A luta entre a vida e a morte de muitos pacientes, familiares, amigos e colegas de trabalho. Ainda inexperientes com um vírus tão letal, os profissionais da saúde colocaram seu rosto a tapa, não só o rosto, mas o corpo todo.

As consequências de uma pandemia geraram muitos transtornos físicos e psico/mentais em grande parte da população mundial. Os profissionais adoeceram e adoecem ainda como uma sequela de todo trabalho desenvolvido. No início o medo era tão grande que muitos profissionais não voltavam para casa com receio do contágio de seus entes queridos, a telemedicina e telepsicologia surgem como aliadas para tentar amenizar e identificar precocemente os possíveis portadores da patologia.

Na minha vida profissional perdas e ganhos sempre foram pleiteadas na assistência ao paciente e pude observar um fenômeno que acompanhou e acompanha cada vez os trabalhadores, seja na área da saúde, educação, segurança, transporte e atendimento ao público dentre outras, a chamada Síndrome de Burnout (S.B.), que iremos falar um pouco sobre essa ocorrência.

Em relação ao CID – Código Internacional de Doenças, as leis brasileiras de auxílio ao trabalhador já contemplavam o burnout desde 1999. No Anexo II do Decreto nº3048/99 ao se referir aos transtornos mentais e do comportamento relacionado com o trabalho (Grupo V da CID-10), o inciso XII aponta a sensação de estar acabado (síndrome de burn-out, síndrome do esgotamento profissional) (Z73.0).

Perniciotti et al (2020) descreve que a Sindrome de Burnout surge descrita pela primeira vez em 1974 pelo psiquiatra Herbert Freudenberger. Atualmente está inserida na Classificação Internacional de Doenças CID-11 sob o código QD85.

Segundo Maslach (2001) está representada em três dimensões interdependentes: exaustão emocional, despersonalização e redução da realização pessoal.

Em um cenário de calamidade global de saúde, muito tem se discutido, sobre o estresse e situações que geram sofrimento emocional em profissionais da área de saúde e os agravos na saúde mental que os acometem, principalmente os profissionais de enfermagem, médicos, fisioterapeutas, psicólogos dentre outros, pois estes se encontram na linha de frente contra o vírus, sendo frequentemente expostos a riscos de contaminação, a falta de recursos materiais e profissionais adequados para a atender as altas demandas de pacientes infectados.

Entende-se que há fatores multidimensionais que consideram aspectos individuais, associados às condições e às relações do trabalho.

A pandemia da COVID-19 gerou preocupação com a saúde mental de toda a sociedade, em destaque os profissionais que estão na linha de frente no combate à pandemia.

Conforme descrito por Lana (2020) a COVID-19 (SARS-CoV-2) é uma variação da família de vírus coronavírus, descoberto pela primeira vez no final do ano de 2019, na China. A doença é caracterizada pela variação entre quadros clínicos assintomáticos e complicações respiratórias graves, podendo ser letal a toda população principalmente à idosos, portadores de comorbidades e imunodeprimidos.

A pandemia da COVID-19 trouxe a exatidão de que tudo piora quando o trabalhador está diante de uma situação de estresse que afeta seu convívio social, aumenta a pressão pela assistência perfeita e os expõem a maiores riscos de contaminação, além do contato diário com a dor do paciente e seus acompanhantes, afetando seu psicológico e sua saúde mental propiciando o surgimento de transtornos relacionados ao estresse e à ansiedade como a Síndrome de Burnout. Lana (2008) ressalta que o termo síndrome de Burnout resultou da junção de burn (queima) e out (exterior), caracterizando um tipo de estresse ocupacional, durante o qual a pessoa consome-se física e emocionalmente, resultando em exaustão e em um comportamento de irritação e agressividade. Em pesquisa em diversas fontes, observa-se que os autores fecham basicamente a classificação em 3 momentos:

  • Desgaste emocional: Mudanças bruscas de humor e Agressividade; Ansiedade; Baixa auto-estima; Esgotamento e sensação de fracasso; Impotência e Pessimismo; Lapsos de memória; Sensação de esgotamento físico e emocional;
  • Desgaste físico: Cansaço e Insônia, Falta de ar; Distúrbios gastrintestinais; Dor de cabeça e Dores musculares; Enxaqueca; Palpitação; Pressão alta; Transpiração excessiva;
  • Desgastes comportamentais: Baixa tolerância à frustração e Baixo rendimento pessoal; Comportamento paranóico (tentativa de suicídio) e/ou agressividade; Depressão e/ou Impaciência; Faltas no trabalho (absenteísmo); Presenteísmo (somente está presente sem ânimo de trabalho); Impaciência; Ímpeto de abandonar o trabalho; Incapacidade de concentração; Maior consumo de café, álcool e remédios; Sentimento de onipotência.

Outra situação que assola esse público é o chamado vilão, que ao mesmo tempo estimula e proporciona a exaustão por cobrança excessiva da perfeição: Alta motivação; Excesso de dedicação; Idealismo elevado; Perfeccionismo; Rigidez.

Tratamento está voltado a terapia com Psicólogos, sendo a Terapia Cognitiva Comportamental Breve focal e a Psicanálise grandes aliadas no processo de restauração psicológica, psíquica e mental. Outro profissional de suma importância é o profissional médico, onde o psiquiatra pode auxiliar o processo de reestruturação com a prescrição de antidepressivos e ansiolíticos. No meio corporativo o acompanhamento dos profissionais pode ser por atendimentos grupais com a prática de oficinas terapêuticas.

Como podemos observar, o tema é de suma importância e atual, pois atinge todas as áreas de atuação profissional e podemos conversar mais sobre o assunto numa outra xícara de café.