A imagem que o senso comum tem da era do gelo provém de filmes e desenhos como os Flinstones, com humanos e animais primitivos como mamutes convivendo em um ambiente congelado. Ainda que essa imagem não esteja inteiramente errada, ela não transmite com precisão a história geológica do planeta. Durante a evolução da vida, o clima se alterou diversas vezes, obrigando os seres vivos a se adaptar a novos ambientes. Nisso já se pode observar a primeira percepção errada, não existiu uma era do gelo, mas diversas eras glacias. De fato, o planeta está vivendo uma era do gelo atualmente. No total, 5 eras do gelo existiram, mas a temperatura não foi constante durante elas, com o clima sofrendo vários momentos de glaciação (avanço do gelo) e interglacial (retrocesso do gelo para os polos). Em períodos de calor é comum que nem sequer tenha gelo cobrindo parte alguma da Terra.

No surgimento do planeta terra, ele era extremamente quente sendo formado de magna derretido, não existem rochas desse período hoje em dia, pois tudo foi obliterado durante o passar do tempo, esse momento é chamado pelos geólogos de Hadeano. Após milhões de anos, a terra começou a esfriar, e o magma se solidificou em rochas. A vida pode começar a se desenvolver. No começo, eram seres microscópicos, como as modernas bactérias, como não havia muito oxigênio disponível, a vida sobrevivia sem ele. A primeira era do gelo foi causada pela chegada desse elemento na atmosfera.

Quando apareceram os primeiros seres capazes de realizar fotossíntese, ocorre a liberação de grandes quantidades de oxigênio na atmosfera. O ambiente do planeta foi afetado. Até esse momento a atmosfera da terra era rica em gás metano. Essa molécula tem uma grande capacidade de reter calor, o que tornava o globo um lugar quente e abafado. A chegada do oxigênio livre acabou com isso. Em contato com o oxigênio, o metano se quebra dando origem ao gás carbônico. Esse gás não retem tanto calor quanto o metano, o que fez com que o planeta se esfriasse, dando início a primeira era do gelo.

Difícil determinar o impacto desse congelamento, pois a vida ainda era diminuta. Mas os seres vivos sobreviveram. E por muito tempo não tiveram que sofrer outro cataclisma. O período seguinte da história geológica foi o mais tranquilo da Terra, sem grandes mudanças ocorrendo e uma evolução lenta, esse período ficou conhecido pelos cientistas como “Boring Billion” (bilhão entediante) pela ausência de fatores impactantes. Mesmo lenta, a vida não parou, os seres vivos se diversificaram e as primeiras criaturas multicelulares apareceram e se multiplicaram.

Ainda que os seres vivos tenham tido longo tempo de tranquilidade, as grandes mudanças voltariam. Elas aconteceram no período conhecido como Criogeniano. Tendo se desenrolado logo após o “Boring Billion”, o Criogeniano viu a chegada de não uma, mas duas glaciações. Os animais e plantas desse período eram ainda criaturas simples, e resistentes que puderam se adaptar a catástrofe, entre eles estavam as esponjas, animais que podem sobreviver a grandes perturbações sem serem afetadas.

O fim da glaciação abriria espaço para a vida crescer e se multiplicar. Sem o gelo novas formas apareceram, o primeiro ecossistema de grande escala da terra apareceu. Animais de grande porte e diversificados foram vistos pela primeira vez e por milhões de anos a vida teve seu momento de prosperidade. A evolução ficou acelerada, pois os animais se tornaram capazes de maior mobilidade, desenvolviam sentidos apurados para correr atrás de alimento e fugir de ameaças. Tipos e formas de animais, hoje irreconhecíveis, apareceram e começaram a competir entre si por espaço.

Por vários milhões da anos, com o clima mais adequado para a vida, diversos grupos diferentes de animais se sucederam ao longo de várias eras diferentes. Até a chegada da terceira era glacial. Conhecida como era glacial do final do Ordoviciano, ocorrida a 460 de anos. Foi provavelmente o período glacial mais mortífero da história da Terra, tendo causado o desaparecimento de 61% dos seres vivos da época. A provável causa do resfriamento foi a multiplicação em grande quantidade de plantas e algas tenha removido o gás carbônico da atmosfera, como esse gás atua retendo o calor no planeta (ainda que de modo não tão eficiente como o metano fazia antes dele), sua ausência teria feito a temperatura colapsar. Esfriando o mundo todo.

Essa era do gelo foi tão ampla que as geleiras atingiram até mesmo o equador da Terra, tendo durado 40 milhões de anos, possivelmente o momento mais frio da história do planeta. O fim do gelo veio quando os vulcões começaram liberar muito gás carbônico na atmosfera, o que permitiu que o planeta se aquecesse novamente. Apesar do enorme estrago para a vida, os animais e plantas sobreviveram. E puderam se recuperar, o fim do desastre permitiu a evolução de novas formas de vida, principalmente no mar, que viu o surgimento de grande diversidade de peixes e de invertebrados.

Durante esse período de abundância, a vida se diversificou. Com animais e plantas se multiplicando, e posteriormente colonizando a terra. Insetos, anfíbios e répteis se dispersaram pelos continentes, na época unidos formando uma única massa de terra chamada Pangeia. E seria nesse mundo que viria a próxima era do gelo. Chamada Era do gelo do Paleozoico tardio. Seria um período prolongado em que ouve gelo cobrindo o sul do planeta por mais de 60 milhões de anos.

Assim como a era do gelo anterior, parece ter sido causada pelas plantas ao remover o gás carbônico da atmosfera (esse período viu o surgimento das primeiras florestas com arvores cobrindo o mundo, o que permitia uma quantidade muito grande de remoção do gás carbônico da atmosfera). Terminou pouco antes dos Dinossauros tomarem o planeta para si. Como o gelo não atingiu o polo norte, apenas o Sul, é sinal de que não causou temperaturas tão baixas quanto sua antecessora, o que explicaria por que não foi acompanhada do desaparecimento em massa de animais e plantas. No final da quarta era do gelo, o planeta mudou, se esquentando e assim ficaria por mais de 220 milhões de anos, para a vantagem dos novos habitantes da Terra, os dinossauros.

A era dos dinossauros foi uma época de abundância e altas temperaturas, alguns apontam que o planeta era quase 30 graus mais quentes que os dias atuais. Esse clima aquecido propiciava um ambiente acolhedor para os répteis. Com o fim da era desses grandes animais, o planeta ainda era um lugar quente. No começo da era dos mamíferos, o clima permitia que florestas tropicais cobrissem o mundo inteiro, inclusive os polos. Mas à 33 milhões de anos começou a última era do gelo. Os mamíferos tiveram seu próprio cataclisma, ainda que não tão devastador quanto o dos dinossauros, foi o suficiente para matar 35% dos animais da época.

A causa dessa era do gelo foi a Antártica. Até esse ponto, os continentes da Austrália e Antártica estavam ligados um ao outro, nesse momento os dois se separaram e a Antártica se moveu para o Sul, ficando cercada por uma corrente marítima fria que baixou bruscamente a temperatura cobrindo o continente de gelo. Os animais não resistiram e logo desapareceram, deixando o local deserto. Gelo reflete os raios solares, então quanto mais congelamento ocorria mais luz do sol era mandada embora da Terra e a temperatura caia ainda mais em um efeito cascata.

Os animais foram obrigados a se adaptar, e não apenas ao frio. Com disponibilidade de água doce diminuindo, o planeta ficou mais seco. As grandes florestas foram encolhendo e espaços abertos se tornaram comum. Uma planta que até então não era muito relevante tomou vantagem, a grama, que dominaria o mundo. Com as florestas dando lugar às savanas, os herbívoros desenvolveram pernas compridas para fazer longas migrações em busca de locais para pastar. Além de dentes resistentes e estômagos fortes para digerir o alimento rico em celulose.

Esses animais que viviam em campo aberto e eram bons corredores, conseguiam facilmente escapar dos antigos predadores, que eram animais enormes, mas lentos e pouco inteligentes. Os velhos caçadores, chamados creodontas, foram desaparecendo e em seu lugar novos animais ágeis, com grandes cérebros, apareceram, como felinos, cães, hienas e ursos. A terra começava a ficar semelhante à como o homem a conhece.

Os primatas foram severamente afetados por essa mudança, com as áreas de florestas recuando, alguns foram obrigados a se adaptar para viver em savanas e a consumir mais carne, os ancestrais humanos apareceram. Se no começo os primatas tinham ampla oferta de árvores para explorar, o que ajudou na multiplicação deles, com diversas espécies de símios de grande porte se espalhando pelo planeta. A redução das florestas diminuiu sua riqueza. Hoje, apenas 5 dos denominados grandes primatas existem: Chimpanzés, Humanos, Gorilas, Orangotangos e Gibões. Mas no começo da era do gelo, eles eram muito mais bem sucedidos, um dos mais impressionantes dos grandes primatas foi o Gigantopithecus, que reconstruções apontam chegava à 4 metros de altura.

Ainda que o congelamento da Antártica tenha esfriado o planeta, não foi o momento mais turbulento. Há 2,7 milhões de anos, foi a vez do Ártico se congelar, dando início a fase mais fria e inóspita da era do gelo. Esse é o período que geralmente costuma ser representado na ficção quando se fala na era glacial, com o Norte da Terra coberto de neve, animais como mamutes, tigres dente-de-sabre, e rinocerontes lanudos convivendo com homens das cavernas.

O senso comum costuma contrastar a era do gelo com o momento atual da civilização humana. Mas ainda se está vivendo a era do gelo, pois o planeta possui gelo nos polos, fenômeno que não é comum na história geológica, entretanto, durante a era do gelo é frequente que a glaciação recue em certos momentos, e foi justamente esse recuo acontecido a 15 mil anos permitiu o desenvolvimento da agricultura por seres humanos e com isso o aparecimento da civilização. Ainda se discute quando o gelo voltará a se expandir novamente, mas a ação humana aquecendo a terra com o efeito estufa parece desequilibrar o ciclo natural da Terra, tornando difícil determinar o que acontecerá com o planeta num futuro próximo.

A terra é um local inconstante, com condições apenas toleráveis para a vida, os animais e plantas tiveram que lutar constantemente durante o tempo para conseguir conviver com as adversidades impostas pelo planeta. As condições atuais não são diferentes, com o agravante que não se sabe até que ponto as consequências da ação humana vão prejudicar a sobrevivência dele e dos demais seres da Terra.